A minha escola primária era daquelas interiormente pequeninas. Quatro salas, uma cozinha, e um recreio gigante. Tínhamos também uma sala de professores paredes-meias com uma mini biblioteca, onde as professoras comiam grandes e deliciosos bolos enquanto nós comíamos pão com manteiga e bebíamos leitinho. Tínhamos o tradicional "quadro preto e giz branco" amoroso. Lá fora era o melhor. O campo de futebol, o espaço livre, as duas zonas de árvores, a caixa de areia e o repuxo que fazia as delicias de todos nós quando o calor aparecia. Havia ainda uma parte da escola, a única exterior para a qual não haviam janelas do interior que permitissem alguém nos ver, e era onde muitos primeiros beijinhos e muita, mas mesmo muita, porrada existiu. Na minha escola primária a minha professora não pensava duas vezes em dar-nos com o apagador de madeira (dura que só de lembrar doí) na mão sempre que havia asneira, mas não se esquecia de louvar as nossas conquistas. Lá deitei uma vez, aquelas que viriam a ser as primeiras e as ultimas lágrimas em frente a toda a escola, após um grande tombo, que teve por principal consequência, rasgar-me as minhas calças favoritas. No Inverno ou íamos para a chuva ás escondidas, ou, na maioria das vezes, ficávamos a patinar no chão cheio de água da entrada que proporcionava muitas gargalhadas. Gargalhadas genuínas. Vivas. De crianças. Felizes. Actualmente vejo as crianças da primária muito mimadas, não sabem o que é brincar. Sonham crescer. Eu não, ninguém sonhava crescer. Sonhávamos ter muita coisa, mudar o mundo de modo a dar para trepar mais ás arvores, ou para haver mais espaço para correr. Sonhávamos encher o mundo de almofadas para ao cair não nos magoarmos tanto. Não chorávamos quando viamos que ficamos com uma cicatriz e não pensávamos que isso não ia ser bom quando uns anos mais tarde fossemos para a praia com os amigos. Nada disso. Nós orgulhávamo-nos delas. Eram medalhas, provas da nossa alegria. Os nossos problemas não eram se estava a chover e não nos podíamos molhar mas sim que estava a chover e tínhamos de pensar numa forma diferente de ir lá para fora, que na ultima vez fomos apanhados. Já me estou a desviar do que queria falar, é verdade, mas não faz muito mal. Na minha escola também aprendi que às vezes desviarmo-nos dos assuntos só dá benefícios. Como quando perguntavam de onde tinha vindo aquele arranhão e nós dizíamos que "bolas! Ao deitar o guardanapo ao caixote do lixo, raspei lá!". Enfim! Na minha escola havia sonhos, havia amigos, havia ensino, havia histórias e estórias para contar. E eu sorrio, afinal, consegui aproveitar aquilo tudo.
Outro dia passei lá de carro, já noite escura, e fiquei a olhar para ela. Foi aumentada, já é um luxo. Já há muito onde brincar quando chove sem se molharam. O repuxo desapareceu. Os quadros já não são "quadro preto e giz branco". Já ninguém levará com certeza com o apagador. Não podem ir brincar para a zona de arvores, está vedada. Acho que tudo lhes veda os sonhos, a oportunidade de serem crianças como eu fui.
Gosto muito da escola antiga, edifício que ainda lá e mantém, rodeado por muitos novos.
Para mim, escola primária, será sempre giz, 4 salas, professoras, e asas para voar...
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